segunda-feira, 12 de agosto de 2013

"DIÁRIO DE UMA VOZ" DEPOIMENTO DO COLEGA LUIS CARLOS CORREA.




         Este é um depoimento do colega Luis Carlos Correa, que também é um Laringectomizado Total e participa das reuniões do Grupo de Apoio ao Laringectomizado “GALA”, no Hospital Santa Rita em Porto Alegre/RS.







DIÁRIO DE UMA VOZ


No dia 05 de abril de 2009, fui ao médico, acompanhado pela minha esposa, porque eu estava com muita rouquidão, quase não podia  falar. Eu já andava assim há muito tempo. Tinham épocas que eu ficava bem, mas com o passar do tempo fui piorando.  Logo o médico me mandou fazer uma biopsia e procurar um especialista.
Eu procurei a minha cunhada que trabalhava na Santa Casa. Ela então arrumou uma consulta e levei meu exame. O especialista me examinou e examinou os exames e constatou que era câncer. Na hora fiquei apavorado. Ele me falou que eu tinha que me operar o mais rápido possível. 
 Quando eu saí do consultório, eu estava apavorado.  Cheguei em casa e comuniquei para minha família.
Dia 05.05.2009 nós fomos ao consultório, eu, minha esposa, meu filho Zeffi, minha sobrinha Valéria, meu sobrinho Beto, minha nora Raquel e meu enteado Leandro.
O médico começou a explicar o que estava acontecendo. Que eu tinha um câncer nas cordas vocais e que tinha que me operar o mais rápido possível. Ele falou para minha família da minha doença. Ele me deu três caminhos: o primeiro era fazer quimioterapia, a segunda  opção era tirar uma corda vocal e fazer quimioterapia mas não me dava garantia de vida e a terceira opção seria  tirar as duas cordas vocais e a laringe. Ele me dava 98% de cura. Eu peguei a terceira opção. Ele marcou para o dia 05.06.2009 a minha cirurgia.
Eu saí dali apavorado, desesperado porque tinha me caído à ficha. Eu chorava muito porque eu pensava na minha vida.
Dia 05 eu internei no hospital. Minha esposa foi comigo. Eu pedi a ela para rezar bastante por mim. Às 7h fui para o bloco cirúrgico, aí só Deus...
Eu acordei da anestesia e estava na sala de recuperação. A primeira pessoa que vi foi a minha esposa. Eu só não sabia o que estava acontecendo, quando eu tentava falar a voz não saía. Aí eu vi o que estava acontecendo e botei a mão no meu pescoço. VI aquele corte de 50 pontos. Eu tentei falar e não consegui.
Três dias depois eu fui para o quarto. Meu filho veio me ver, minha nora Raquel e minha neta Julia. Me deu um desespero tão grande ...
Eu queria falar e não conseguia. Foi meu maior desespero. Eu não falava, tentava falar, mas só mexia com a boca e com as mãos. Senti que meu filho ficou apavorado, mas não demonstrou. Foi então que minha esposa desceu e comprou um caderno para eu escrever. Aí eu comecei a me comunicar. Eu tinha muita tosse. Um dia meu enteado Leandro foi me ver e durante a visita tive uma crise de tosse. Ele ficou tão apavorado que fugiu. A Taize foi me visitar, meu sobrinho Beto e minha sobrinha Valeria, a Viviane, o Artur, o Michel, o meu amigo Jair, a Fátima. Só meu filho Fábio não foi me ver. Na época ele estava preso. Minha nora Augusta e a minha neta Vitória também não foram me ver.
Mas depois com o passar dos dias eu comecei a conviver sem aquele pedaço. Cada dia era mais difícil. Eu fiquei 17 dias com sonda sem comer nada pela boca.
Eu comecei a entrar em depressão. Cada dia que passava batia mais o desespero. Eu só pensava em suicídio. Eu ia me jogar do 3° andar do hospital. Eu só pensava como ia ser a minha vida dali para frente. Como ia ser a minha vida sem poder falar, como ia ser a minha vida...
Depois de 18 dias eu tive alta do hospital. Eu perguntei ao médico, o doutor Fábio, se eu podia comer alguma coisa. Então ele falou com a minha esposa. Ela disse que eu só ia embora quando ele me tirasse à sonda. Então ele tirou e eu estava de alta.
         Meu filho Zeffi trouxe um pastel e um refrigerante para eu comer. Eles me trouxeram para casa. Quando eu cheguei à frente da minha casa eu não acreditei. Estava começando uma nova etapa da minha vida. Eu sabia que ia ser difícil aquela caminhada. Mas era só o começo. Eu queria saber como meus amigos iam me ver. Muitos falaram outros não entendiam.
A minha sorte é que eu tinha uma guerreira do meu lado me dando todo apoio. Tínhamos nossos filhos, mas eles têm a vida deles e eu não falava, só escrevia.
O médico me indicou ir na santa casa, pois lá tinha um grupo de apoio – o GALA. Eu fui bem recebido pela Drª Vera Fonoaudiologa. Ali vi que eu não estava sozinho. Naquela estrada a Drª Vera me explicou como era aprender a voz esofágica, que era difícil, mas que tendo força de vontade talvez eu conseguisse, porque não são todos que conseguem. Explicou que eu tinha feito uma laringectomia e retirado as cordas vocais, e toda a laringe... Eu só tinha o buraco no pescoço onde eu respirava, agora não respirava mais pelo nariz e pela boca.  Tinha também outra opção, comprar um aparelho que parece alto falante, a gente pressiona conta o pescoço e começa a falar com uma voz biônica.   Eu não gostei desta idéia mas comprei, custa muito caro. Ai coloquei na minha cabeça que tinha que aprender a falar a voz esofágica: pra quem não sabe, a gente engole bastante ar no esôfago e solta o ar. A Nilda, a Drª Vera puxavam bastante por mim, mas eu olhava para os outros e não via ninguém falar, aquilo me desanimava. Quando foi um dia veio um senhor no grupo que eu não conhecia. Ele começou a falar e eu disse oh! Meu Deus, eu vou aprender a falar com as pessoas e não vou precisar mais escrever. Ai eu comecei a praticar bastante e quando eu ia ao grupo eu me sentia bem.
A gente aprende que cada um tem uma estrada pra seguir. Eu ia ficando com coragem pra seguir sempre com muito apoio do meu filho Jeffi, da minha esposa Nilda, meus enteados (Vivi, Leandro). Toda pessoa que passa por este problema fica muito frágil. Quando faziam três meses que eu estava no grupo eu comecei a falar aos poucos. Vocês não sabem a alegria que eu sentia me comunicando sem precisar escrever. Eu via aquelas pessoas do grupo com mais tempo que eu e eu estava conseguindo. Cada dia que passava eu melhorava, Eu já conseguia sair sozinho, eu tenho carro, eu viajo, eu gosto muito de pescar, gosto de dançar. A minha esposa, parceira pra tudo. Toda a família que tiver uma pessoa com este problema necessita de apoio. Ajude que a vida depende de apoio de todos porque nós estamos vivos, nós temos muita coisa a oferecer.
Estou seguindo a minha vida.  Tem momentos de depressão, mas passam. Deus me deu uma segunda chance de vida. Agarrei.
Quando faziam 7 meses que eu tinha operado, eu fui trocar uma telha da minha garagem, caí do telhado e quebrei o braço. Deu fratura exposta. Fiquei 5 dias no hospital. Eu tive uma segunda chance de vida.
Fazem 4 anos que eu me operei. Faço todos meus exames.  Fui bem tratado na Santa Casa. Daqui há um ano, se tudo der certo, eu estarei liberado.
Muita fé, muita força nesta hora difícil aos meus amigos do grupo.
Agradeço ao GALA, agradeço à Drª Vera, a todas as doutoras do grupo.
Muito Obrigado por tudo.
Esta é a história da minha vida.

          Luis Carlos Correa


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